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About a Girl

Minha foto
"Nasci em 1992, no interior do estado. A dança-teatro e o cinema formaram meu primeiro imaginário: a palavra vinha como complemento das imagens. Quando descobri os livros, bem cedo, aceitei-os apenas como o lugar das palavras e das idéias, vendo as imagens a que remetiam ou sugeriam, como fantasmas imponderáveis e sem substância, descabidos, impróprios para aquele tipo de veículo. Quando me pedem que fale de mim mesma, sinto o incômodo, pergunto: que imagem devo projetar? Tenho tantas. Acho que a melhor para o caso é a que passo nos próprios posts, de alguém que escreve mas não acredita nos fantasmas das palavras, embora eles sejam inevitáveis. E a melhor forma de conviver sem temor com essas fantasias é jogar com elas, torná-las risíveis, desautorizá-las, de modo a evitar o poder técnico abusivo que tem quem escreve, para iludir o leitor."

Aos destinatários destas palavras

"Pra dilatarmos a alma
Temos que nos desfazer
Pra nos tornarmos imortais
A gente tem que aprender a morrer
Com tudo aquilo que fomos
E tudo aquilo que somos nós"


O Teatro Mágico

Quem lê

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Fosse ou não (e acho que não era) parte da coreografia total, ainda assim suas palavras produziam efeito.
Especialmente naquelas meninas suscetíveis ao que chamamos de paixão de estudante, como eu. Um tipo de emoção - ás vezes muito forte - que uma menina sente pelo professor ou diretor de uma peça. E o objetivo dessa emoção geralmente é mais velho, o bastante para ser pai da menina.
É assim um misto de amor que se tem pelo pai e do amor que se tem por um amante.
Era como se ele soubesse o segredo de variar de tamanho, como Alice, no começo do livro.
Podia ser muito adulto e paternal, e subitamente diminuia, com a alegria e espontaneidade de uma criança.

Sombras

Posted on 14:40 In:





















A verdade nua e crua era que sentia falta dele, mal podia imaginar a vida sem ele, estava sempre esperando encontrá-lo na sala ao lado, em uma das poltronas que sempre usava, ou entrando por uma porta, dizendo: "Ah, Alice!", com uma expressão que sempre parecia de prazer autêntico.
Não conseguia encará-la de frente, via apenas as sombras lançadas pela espera da morte.
Estava sendo tola e até covarde, estava cansada de se fingir corajosa.
Sem ele para servir de audiência, parecia não haver nenhuma razão para continuar a luta.
Havia suportado a morte dos pais com bravura, mas agora podia sentir o que bem quisesse.

Um chá

Posted on 14:17 In:

Tinha a fatal ilusão de que não tinha ilusões...

- Você ainda se importa? - disse Rhoda
- Sim, eu me importo - admitiu Alice.
- Tolice!
- A tolice é uma parte essencial da vida - disse Alice, permitindo-se um sorriso malicioso.

Não fazia muita questão de que ela entedesse. O tempo que tinham passado juntas fora suficientemente deprimente.



















Sentia-se um impostor.
Em sua própria casa, com sua própria mulher, sentia-se um estranho.
Dava lhe um prazer sombrio essa sensação.
Era como o presságio da sua partida iminente, uma sugestão tentadora do que seria, não exatamente olhar para baixo, através das nuvens, para sua antiga vida e sua viúva, mas suficientemente próxima disso para ser fascinante.
Várias vezes notou como Alice passava geléia metodicamente na torrada. Ou, no fim da noite, observava com a atenção de um naturalista o modo como ela colocava os anéis na penteadeira e o bracelete de ouro trabalhado na caixa forrada de veludo.
Afinal, os pequenos gestos eram tão cativantes como qualquer coisa que ele pudesse imaginar.

Vislumbres roubados.
Lampejos colecionados.
Prêmios estimados.
Era totalmente absurdo, o oposto de qualquer manobra razoável por meio da qual ela estaria armazenando lembranças dele, tentando fixá-lo nos olhos da mente para os anos vindouros. Estaria ela?
Ele achava que não. Sabia que, quando ela fechava os olhos, não era para congelar o presente, mas para derreter o gelo do passado, para voltar ao paraíso perdido da infância, ser aspirada de novo para dentro daquela toca de coelho...

Porém, cedo ou tarde ele iria embora,
e mesmo não querendo ser nietzscista,
Alice sabia que aquela toca de coelho era apertada demais para dois.





















Ele poderia ter tirado Alice da toca do coelho,
podia ter sido Orfeu e ela Eurídice...
com mais suavidade ou mais aspereza do que tinha usado todos aqueles anos. Ou com maior insistência.
Não só na cama, mas no modo de vida dos dois...
Ela sempre se retirava para aquele seu mundinho no País das Maravilhas e ele respeitara essa atitude, porque achava que era isso que era o certo a fazer.
Mas isso tinha significado esconder dela os seus sentimentos.
Privara-a das indicações, às quais ela poderia ter reagido, de que se sentia só, de que tinha medo. Era mais sincero com as moças de Glenda*, permitindo que soubessem do que ele precisava. Naturalmente, eram pagas para lhe dar prazer e tinham obrigação de servir, lisonjear e até mesmo mentir, dizendo que ele era maravilhoso, caso fosse isso o que ele quisesse ouvir.




*Amantes do bordel de Glenda.


- Do nada não se pode tirar nada - disse ele.

- Perdão, o que disse?

- Nada, nada - respondeu ele. - Na verdade, quem deve pedir perdão sou eu.


A jovem era atraente, tinha muita boa vontade, havia tentado ao máximo com ele, mas nada, nada, nada, nada. Para parodiar o rei Lear. A outra citação era também de Lear, Hargreaves tinha certeza, embora fora de contexto.

O cabelo vermelho da jovem espalhado sobre a barriga branca dele era um espetáculo doloroso.


- A culpa é minha - disse ele - Ou pelo menos não é sua. Não tenho passado muito bem.

- Coitadinho - disse ela, com um último tapinha de adeus no membro flácido. - Aceita champanhe? Ou um brândi?

- Se me acompanhar. Champanhe?

- Bem, só uma taça - disse ela. - Vou buscar. - Vestiu um longo robe trasparente.


Hargreaves ficou ali deitado, considerando os absurdos da sua posição.




























[...]

- E ela é feliz? - perguntou Alice.

- A mim pareceu que é - respondeu ele - , mas acho que dece ter feito questão de se mostrar feliz... para mim. Ou para você. Trata-se do que você representa, eu acho, para muita gente, e para ela também.

- O que é que eu represento?
- Felicidade. Ou inocência. O que podemos lembrar da infância ou o que imaginamos. Você é a infância que todos nós gostaríamos de ter tido. E quem quer admitir ao próprio eu da infância que não conseguiu encontrar a felicidade?
- Acho então, que ela tem sito tão feliz quanto a maioria de nós.

Sick Boy

Posted on 22:36 In:






















Enquanto inalava o pó, eu o observava.
De longe, mas não tão longe.
Eu, de frente.
Ele, de perfil.
Meus cabelos atrapalhavam um pouco a minha visão ou era eu que não queria ver?
Mas estava bem atenta ao rosto dele, para que não me escapasse qualquer tipo de expressão.

Ele continuava a inalar.
Parava, me observava.
Inalava, com crueldade.
E eu na mesma posição, com a cabeça um tanto abaixada, mas o olhar erguido.
Olhava para dentro dos olhos dele durante a pausa que ele dava para me olhar.
Me arrancava um sorriso de canto de boca, mas eu abaixava a cabeça novamente e continuava a escrever.

Sobre o que?
Sobre aquela bela e ao mesmo tempo desprezível visão.
Se você observar, verá que ele é tão doce quanto eu.
Ou pelo menos tanto quanto finjo ser.

E toda uma vida, toda uma morte passa pela minha cabeça.
Tudo que é belo e nojento.
Amor, ódio.
Vida, morte.
Nesse exato momento, enquanto ele se mata aos poucos, me torturando, eu o vejo como um pai que partirá em breve, como um noticiário triste de um patético telejornal, como um amante que simpatizei, como um amigo que não mais terei.
Então, ele será apenas um pretérito, o meu pretérito mais-que-perfeito.






*Na foto o personagem mesmo sendo do mesmo filme, não é o "Sick Boy". Porém achei que ficou melhor caracterizado assim.

A Família

Posted on 13:33 In:


"O mais difícil de tudo era serem todos pessoas tão simpáticas.
Ele o amava, mas enchiam-no de tédio, e quando chegou domigo à tarde foi um alívio estar guiando para o aeroporto.
Sentia-se culpado por pensar assim, mas eles todos levavam vidas tão normais, tão rotineiras. No final de um fim de semana ele sempre se sentia um desajustado. Pelo menos a mãe se divertira."



"Continuamente leva a mão ao bolso traseiro da calça para sentir a segurança do frasco arredondado de bebida, de alumínio fino mas sólido, prometendo consolo e coragem, assim que ele possa encontrar um lugar convenientemente isolado. Como Fotheringay, que também bebia às escondidas.

Fotheringay, companheiro no serviço da Guarda Escocesa, certa vez admitiu que o homem que bebe sozinho é o pior tipo de bêbado, mas quando Caryl perguntou por que então não procurava se corrigir, Fotheringay respondeu: - Ora, Caryl, as pessoas que podem se controlar não compreendem o problema. Não têm a mínima ideia do que é a vida. Vivem em um sonho. Para nós, o único meio é com a ajuda da bebida."

O Mergulho

Posted on 13:14 In:



























"Apóia-se no atril para se equilibrar melhor.
Seria terrível desmaiar, pensa ela.
Mas seria aceitável morrer ali, para ser transladada do tempo naquele instante, conduzida para a eternidadde por aquele aplauso infatigável.
Ser devolvida àquele País das Maravilhas, que ela viu de relance mas nunca conheceu, ou no qual viveu tão brevemente, que mal consegue se lembrar!
Os olhos de Carrol*, ela lembra bem, eram límpidos e tristonhos, mesmo quando ele contava piadas, mesmo quando estava rindo.
Ser devolvida àquele olhar sombrio ou finalmente se libertar dele - as duas coisas seriam aceitáveis."







*Lewis Carrol, escritor de Alice in Wonderland

Adiós Amigos

Posted on 09:46 In:



























Éramos cinco,

Éramos quatro,

Éramos três,

Éramos plenas.

Riamos e brincávamos as custas de nossas próprias tragédias.

Éramos três confidentes, três passados e três futuros, que sonhávamos um dia ser entrelaçados.

Éramos a base da pilastra central.

Mas um dia todos os sorrisos foram lentamente ficando amarelados, e o telefone não tocava mesmo em datas especiais.

"Desculpe-me por algo que não fiz".

Começou com sorrisos distantes e terminou com faces mórbidas e duras por falta de expressão.

Mas hoje eu posso dizer adeus, pois choros no canto da casa que fui intrusa não me comovem mais.

E os encontros ficaram marcados por um único elo fraco e transparente, que por muito tempo, foi a base de sustento de algo que já ruiu.

O que somos agora além de perfeitas estranhas?

Estranhas que julgam e machucam por ter orgulho demais.

Acabou-se toda a magia e cor do nosso agora distante "arco-íris".

É o fim do BNDU, e o início de toda a minha tortura com relacionamentos frustrados.

Sejam bem vindos ao mundo real.

E nesse mundo não há amiguinhos nem arco-íris.

Aqui você está só, você se vira só, e se não se virar será sugado até os ossos.


*Foto: Alice no país das maravilhas, Alice e o Coelho.
Escrito em 23/07/09