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About a Girl

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"Nasci em 1992, no interior do estado. A dança-teatro e o cinema formaram meu primeiro imaginário: a palavra vinha como complemento das imagens. Quando descobri os livros, bem cedo, aceitei-os apenas como o lugar das palavras e das idéias, vendo as imagens a que remetiam ou sugeriam, como fantasmas imponderáveis e sem substância, descabidos, impróprios para aquele tipo de veículo. Quando me pedem que fale de mim mesma, sinto o incômodo, pergunto: que imagem devo projetar? Tenho tantas. Acho que a melhor para o caso é a que passo nos próprios posts, de alguém que escreve mas não acredita nos fantasmas das palavras, embora eles sejam inevitáveis. E a melhor forma de conviver sem temor com essas fantasias é jogar com elas, torná-las risíveis, desautorizá-las, de modo a evitar o poder técnico abusivo que tem quem escreve, para iludir o leitor."

Rabiscos Velhos

Aos destinatários destas palavras

"Pra dilatarmos a alma
Temos que nos desfazer
Pra nos tornarmos imortais
A gente tem que aprender a morrer
Com tudo aquilo que fomos
E tudo aquilo que somos nós"


O Teatro Mágico

Quem lê

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Despedida do Quarto do Segundo Andar

Posted on 21:21


















Três túmulos, aquele quarto; nossos sofrimentos e temores sepultados em ruínas.

A saudade sempre se pune com a impossibilidade de ressurreição.
Não me viriam pensamentos amargos, quando em minhas horas de insônia evocasse novamente aquele quarto no segundo andar.
Pensaria nas paredes, no vinil que lhe dei e em como, entre elas, fui feliz.
Teria recordações do jardim, das rosas no estio do vizinho, dos pássaros e do sons da guitarra.
Do sumo do guaraná sob a sombra da amoreira emoldurando as paredes, do murmurio dos seus dedos encontrando-se com os meus pela noite.

O luar tem grande influência sob a imaginação, mesmo a imaginação de quem começa a sentir que talvez seja preciso se desfazer de um sonho.
E ali, queda e silenciosa, eu jurara como Capitu não ser a minha própria casa.
Recheada dos seus passos e cachos morenos, ainda tenho a impressão de que todos os anseios do mundo se vão quando me toma pelos braços.

No silêncio dessas noites eu tentara, em vão, despejar a tortura da sua indiferença numa concha morta. Que se engasgava acelerada em meu peito, mas era um ser que respirara, palpitando vida como outrora.
O tremor ainda me visita, me encolhe. Foi esculpido temeroso de sentir mais uma vez todo o vazio da falta de chão.
Um ardor nos olhos impede-me de chorar ou me culpar mais uma noite. Fui fiel no ardor da espera, te fiz Ulisses, mas não o pintei com a mesma bravura. Tua balança impedia-me, constrangia minha face no reflexo.

É preciso prometer que o tempo não quebrará a perfeita simetria do que fora.
É preciso juras, ações que acalentarão meu corpo do temor do seu próximo silêncio.
É preciso, mas o coração saudoso e apaixonado se esquece rápido por demais do sofrimento de outrora.
Mas, se de certo, não desejar rever a dor das minhas mãos geladas e trêmulas, hei de abri-las, e tirar do côncavo minha joia mais preciosa.
Minh'alma dilacerou-se demais desta vez, tornou-se descrente com seus abandonos.

A Estrada, o Amor e a Morte

Posted on 21:37
Não sou convicta, valente ou segura. De fato, gostaria de ser uma exclamação, mas no lugar disso tornei-me um ponto e vírgula: tímido, indeciso, um separador de palavras e expressões.

Essa noite eu pensei de várias formas em como escrever na terceira pessoa. O intuito é bem claro: fugir dessa vida pouca que possuo, recheada de realidade por demais. Ao mesmo tempo para despi-la anonimamente na minha zona de conforto. Vivo de fugas, as vezes me considero uma eterna Sabina*.

Raramente escrevo a palavra "amor" no papel, como se ela me desautorizasse, ou simplesmente não fosse digna de dar o ar de sua graça e beleza nos sentimentos e devaneios que tenho de uns tempos pra cá. Me pergunto se me desvio do amor por questionar constantemente se meu amor próprio não se tornou um ponto de interrogação mal escrito.

Martirizando minha terceira pessoa, pergunto-me se o arrepio que sinto é apenas uma brisa constante, repleta de vírgulas e sonhos. Concedi-me essa noite permissão para escrever sobre o amor - e todos os sentimentos difusos que vejo em você.

Estou anestesiada há dias, não me envergonho de dizer que meus pensamentos são mórbidos e descrentes. No entanto, não sei dizer se esse luto é pela minha morte em você, pela sua morte em mim, pela morte do amor, das fortalezas e castelos palpáveis de sonhos que construímos ou do meu desejo de terminar tudo isso de uma vez não acordando mais.

Como disse, vivo de fugas, mas elas já não me alimentam há dias. A paixão dos suicidas que se vão sem explicação é incerta e confortável, mas constante.

A esperança que me dás é desalmada, agressiva e egoísta.
A esperança que me dás tem sangue covarde.
A esperança me mostra o quanto é mais importante para ti me ferir para conseguir olhar mais uma vez em meus olhos.

Por fim, a única certeza que tenho é que todo esse plano maquiavélico reflete quem você realmente é, quem eu mais tinha medo que você se tornasse, quem um dia segurou nas minhas mãos trêmulas
e prometeu que não se tornaria - mais uma vez.

Seus rabiscos já não marcam meu papel. Suas certezas se foram do meu coração.
Seu amor é incompatível com a verdade. Suas ações são cruéis e descuidadas, vazias da empatia e cuidado que têm o apaixonado. Mas, se de fato pensas que há amor, reflita se ainda és digno da afeição do meu toque.

Contradizendo minha força oscilante, confesso que o medo assombroso de te perder é inimaginável,  dilacera cada pedaço do meu corpo. A sensação de não estar realmente viva, advém de um soco no estômago, um vazio que não tem fundo. Não se vai, temo que nunca se vá, e assim os dias se tornam meses, os meses se tornam anos. O tempo é lento e incerto no menor pensamento de esperar seus olhos na minha porta.

Desejo esperar, mesmo depois de teres me matado inúmeras vezes.
Meu Deus, por que essa esperança amaldiçoada permanece?
Talvez eu ainda seja aquela garotinha sardenta de quatro anos que acredita com todas as forças que, se deixar de se alimentar, o tempo irá retroceder. Assim ela, enfim, terá sua chance de fazer tudo novamente, de focalizar o sangramento nas tentativas de concertar o que o tempo levou embora.


*Sabina: personagem do livro "A Insustentável Leveza do Ser" de Milan Kundera

Hope

Posted on 19:38




















Sobre o nada eu crio profundidades. Sobre a dor eu recorto gravuras não palpáveis.
Os gregos costumavam dizer que a esperança veio da Caixa de Pandora, sendo, portanto, mais perigosa do que qualquer água turva.
Escrever alivia mas reflete a nudez da minha dor. Não posso mais me culpar, de certo, poderia ter feito muitas coisas diferentes, mas o ar retorna mais leve nos meus pulmões quando vejo que tentei.
Talvez, eu esteja esperando algo que já se foi. A areia azul escorre em minhas mãos, não cobre feridas ou desejos, mas afasta minha esperança.
Minha tão dolorosa esperança! Sinto que ela me acalenta cada vez mais próxima a morte.
Olho para os dedos gelados, ossudos... O espelho envergonha e o alimento se foi mais uma vez.
Você está destruindo lentamente cada pedaço do meu coração, a cada momento sinto-me mais próxima do cadáver que tenho medo de tornar.
No entanto, esse medo também vem do fracasso ao ver minhas forças voando para longe, deixando apenas essa visão turva e cruel.
Mais angustiante do que ter esperança de rever seus olhos é acordar todas as manhãs e não encontrar sentido em acordar novamente.
Por favor, mate-me logo. 

Sonho de Primavera

Posted on 00:29

Arrumei as malas de vez. Parei de fechar os olhos e me imaginar voando, desvencilhando de obstáculos e sorrindo como uma criança que corre sem coordenação motora.
A balança era pesada, de fato. Os livros já traziam mais dor e sofrimento do que vislumbres de um futuro certo e estável. A frieza dos códigos e a falta da intertextualidade faziam-me estremecer todas as vezes que olhava aquele terno.

Dos sorrisos é que mais irei sentir falta, dos abraços calorosos e da doçura das tardes quentes. Vou sentir falta das mãos de moça, sábias e famintas que tanto enriqueceram minha vida. Descobri sentidos e cores femininas pela primeira vez.
Abandono meu prestígio cedo mas em tempo, me sinto as vezes como um astro de rock mimado. Mas acredito que me despeço porque sei que meu reflexo permaneceu, intacto, naquele prédio. Assim deve, portanto, ficar.
Deixo resquícios de um certo respeito que orgulho ter vivenciado, pelos sábios mestres que me incentivaram e pelos que me desmotivaram também - é deles que me orgulho com todas as forças de ter conquistado o olhar.

Arrumo as malas para um futuro incerto, agarrei-me à escrita como guia fiel. Desejo que meus atestados e receitas médicas sejam diluídos em cada linha de um papel que já não será só meu, mas de onde minha voz puder alcançar.
Não desejo que as pessoas recordem meu nome, ou meu rosto, minh'alma estará preenchida se qualquer pensamento que a caneta carrega puder se fechar com a verdade de outrem.
A eterna busca pela empatia do estranho através da leveza das palavras.

Acredito que esteja percorrendo o caminho certo para almejar esta vida doce, leve como uma estória e tão sonhada e fantasiada como tal.
Agradeço à Nietzsche, que me mostrou que uma vida não basta mas é tudo que temos e tudo que teremos para deixar nossa singela marca neste mundo.
A sabedoria dos escritores me fez vislumbrar um trem, rápido demais para ser alcançado. Se um dia eu e meus sapatos oxford o alcançaremos a tempo, não sei dizer. Arrisco um final tolstoiano sem medo, abraçando a escuridão do destino.

Sempre fui de dar voltas, ler sobre tudo possível até decidir e finalmente escolher. Dificilmente sei dizer bem o que quero, mas sempre soube expressar com veemência tudo que não quero.
Dessa forma, de todo o medo que possuía, sabia que mais cedo ou mais tarde teria que desfazer das minhas vírgulas e colocar um ponto final na redação.
Não sei porque, me sentia fraca por correr. Perguntava-me se no fundo tudo isso não fosse uma fuga. Se estava lúcida o suficiente para abandonar todas as noites viradas e esvairadas dos meus últimos dois anos.
Ainda estou perdida, mas agora há algo diferente, que cobre a angústia e me traz certa paz.
A escolha veio naturalmente, no começo tímida e frágil e depois forte e imponente. Como se não existisse realidade sem as marcas no corpo de tudo que ronda o imaginário do Dever Ser.

No final, tudo que importa é o que navega a mente do homem ao final do dia. A tentativa do sono trouxe-me um sonho: minha velha câmera, meus amontoados de cadernos de esboços e divagações ao longo dos anos. Minha voz... guardada num tempo perdido. A luta pulsante, para o estranho, pelo estranho, onde cabe toda a cegueira da humanidade.
Peguei o telefone, senti meu peito acelerar. Liguei. A frase que ouvi logo em seguida da narrativa nunca me sairá da memória "Você sonhou que era uma Jornalista, não percebe?".

Lacunas

Posted on 13:53























Ver o brilho dos seus olhos escorrer ao encontrar os meus é o que dói mais.
Sentir seu corpo distante e seus ouvidos no timbre do relógio, me trazem pesadelos a noite.
Passei o dia olhando nossas fotografias moreno, pensando no seu toque, senti falta até mesmo do macarrão que você faz.
Como tudo isso parece tão distante hoje, pequenas lembranças que se esvaziam lentamente da minha pele. Pequenos símbolos que de tão bons, tanto doem.
Emagreço.
Amo.
Enlouqueço.
Grito.
Desconheço.
Sou uma total incapaz ao tentar cicatrizar as lacunas, que já se tornaram abismos.
Tornei-me uma pessoa sem voz já faz um tempo, talvez eu deva tentar silenciar também meu coração, como fez você com o seu. A angustia enjaulada nesse órgão me enfraquece de dor, tudo que desejo é ignorar e desacreditar em suas previsões de mau agouro.
Nunca perco a esperança, talvez este seja meu erro. Estou nua moreno, armada somente com a agonia da minha busca que parece nunca ter fim.

Inverno

Posted on 13:34





























Há algo sombrio no pôr-do-sol, não sei se são as cores ou toda a sinestesia presente no contexto, só sei que por trás dos panos do horizonte vejo um aperto. Aperto doído e prolongado. É o anúncio da despedida, do sereno envolvente da madrugada, daqueles que gelam da espinha aos pés.
Enganei-me ao aguardar o inverno, permaneci paralisada pelo medo enorme de ao menos esperá-lo, como uma criança, torturada pela ansiedade. Sempre expressada na solidão do timbre das palavras no papel.
Desta ânsia de batalhas, encontrei-me jogada no tão esperado recinto assombrado. Mal percebera que já era inverno e nada podia-se fazer. Não há preparativos e escudos ao alcance.
Diante do choque do inesperado, sinto a dor de uma mente espancada, vejo meus cabelos ao chão.
Assombra-me o pôr-do-sol, assombra-me ver o vermelho se pôr. Pensar em senti-lo trocado por outros tons petrifica por completo meu corpo e alma. Como toda esta dureza se desdobra em agonia tão rápido?
Meu Deus, vende meus olhos, mas me poupe da balança. Têmis não me concedeu nada além da lâmina. Dê-me a cegueira como anestésico, me cegue da dureza, da angustia dessa dor. Rouba-me a lâmina, a paranoia e meus fantasmas. Faça-o depressa, antes que chegue o pôr-do-sol.

Isolamento

Posted on 15:36





























Amedrontado todos os dias, todas as noites,
Ele a chama em voz alta lá de cima
Cuidadosamente espreitando por uma razão,
Meticulosa devoção, meticuloso amor
Renunciou à auto-preservação dos outros que apenas importam-se consigo
Uma cegueira que toca a perfeição, mas machuca como qualquer outra coisa.

Isolamento, isolamento, isolamento.

Mãe, eu tentei.
Por favor, acredite em mim, estou fazendo o melhor que posso.
Me envergonha as coisas que tenho feito,
Me envergonha a pessoa que sou.

Isolamento, isolamento, isolamento.

Mas se você apenas pudesse ver a beleza,
De tudo que eu nunca poderia descrever,
Destes prazeres - caprichosos, distrativos
Este é o meu único prêmio da sorte

Isolamento, isolamento, isolamento...



Joy Division


A minha resposta pra você

Posted on 00:03

Como expressar em palavras essa sensação que percorre todo o meu corpo?
Como entrar para o grande clube dos que construíram através das palavras a história do amor?
Posso dizer que ao lê-lo padeci da mais estranha mistura de sentimentos, de modo que não sabia se devia rir ou chorar. A escassez de minhas reações estremeceram meus lábios, buscando palavras que quase nunca ousei usar: alma, fé, paixão, fidelidade e por fim amor.
Reconheci o amor, límpido, sábio, desprotegido. Aconchegado, confiante que o tomaria como meu, cuidando e protegendo-o, fazendo o que entendesse de melhor.
E fiz. Farei, trouxe a meu coração a missão de protegê-lo como leoa, de ver em seus olhos um fragmento do sentimento que invade meu peito neste momento.
E assim, como a mais feliz das mulheres, acolhi seu amor.


Número Três

Posted on 23:11




























Não foi só a cópia de uma chave,
Não foi só seu paletó em meus ombros.
Foram os braços, entrelaçando-se na valsa do filme.
Foi o beijo na testa e o "minha menina".

Pequenas palavras insignificantes, agora se alteram apertando os olhos e o coração.
Corações de fênix, decidiram tornar-se um só através dos escritos.
Distorcendo as letras, os sons e a responsabilidade para a droga.
Oscilando na linha tênue da sanidade, adoecendo, voltando à droga.

Por três vezes pecou,
Por três vezes amou,
Por três vezes morreu e das cinzas voltou.



Reflexo azul

Posted on 07:21

Minha "injeção de ânimo", como costumo me referir ao falar com eles, tem sido substituída. Embora a pílula roxa tenha sido estendida não é dela, materialmente falando, que vem a teia que me estende da cama com sutileza.
Todos os longos olhares e batalhas travadas só podem suspirar em jubilo pela imensidão azul que já não vejo mais. Encontrei de novo uma e estou lutando todos os dias para ser dela minha salvação.
Que as faces distorcidas permaneçam, mas silenciadas pelo barulho do diafragma e concretas apenas no plano de fundo da imagem.


Look what you've done

Posted on 14:18



















Sinto-me tênue, vaga, diluída, desumana, sem fibra e a perder tempo com bagatelas que afetam não só a mim, mas a todos que amo.
Por que machuco as pessoas que amo? Por que as iludo dizendo o que querem ouvir? Por que as traio?
Qual o intuito dessa necessidade de permanecer sempre em fuga?
Na verdade, eu me sinto tão trágica e calculista que ando escondendo meus impulsos até mesmo dos especialistas que se pactuaram em me ajudar...  E, meu Deus, como me sinto a mais ruim das pessoas e com um incontrolável e assustador sentimento de permanecer sempre assim... Na Busca por algo, incessantemente buscando algo.
O quê? Não sei dizer ainda... Seria esse o meu kitsh? O meu monstro? Temo ser ele a minha destruição e a dele. Ninguém é capaz de suportar tanto, não importa o quanto ame.
Tenho consciência de ser o elo fraco e invasivo que sempre o testa, estremecendo-o até o último pingo dos nervos.
A minha busca é desumana e egoísta e ele é o néctar da bondade da natureza dos homens. Como eu gostaria de ser como ele. Como eu gostaria de ser como ele por ele.
Não duvido que amo;
Não duvide que amo;
Ele não duvida, eu sei.
Então a quem devo culpar? Ao kitsh? As pragas em meus livros? A arte que se foi? Ao transtorno?
Suporto tudo da minha auto destruição, menos rotular minhas ações pela medicina.
O silêncio.
Os ouvidos que não desejam mais ouvir nenhum tipo de conselho.
O sinal da própria perdição.
Mas é inacreditável como é capaz de deitar a cabeça no travesseiro a noite, fechar os olhos e simplesmente adormecer.
Ter a consciência da minha desgraça é o que me dá esperanças de mudar. Me agarrar que aprenderei a suportar a mudança sem a fuga, pela primeira vez na vida.
Por ele, por mim, por nós.

Posted on 06:55


















"E puseram-se a conversar como velhos companheiros, o que não deixava de ser estranho, pois conhecera-o uma hora atrás, comentou ela como talvez todas as mulheres costumassem fazer. Acaso não eram cúmplices, ambos buscando algo por trás dos rostos secretos? Depois de confessar isso, ela fez uma pausa e, como as mulheres sempre faziam, ponderou se seria correto falarem tão abertamente um com o outro. E acrescentou:
- Talvez porque nunca nos vimos antes e nunca nos veremos mais.
[...]
Não poderiam ter dito naquele momento, em que ponta se achavam, pois essa aleia era tão lisa como um anel de ouro. Mas os gregos, ou seja, Platão e Sófocles e os demais, eram íntimos deles, tão íntimos quanto qualquer amigo ou um amante, e respiravam aquele mesmo ar que beijava as faces e vinha, só que eles, como jovens que eram, ainda impeliam à frente e questionavam o futuro."

Virginia Woolf

Uma faixa de passeio sobre um abismo

Posted on 20:52





























Porque será a vida tão trágica?, tão semelhante a uma pequena faixa de passeio sobre um abismo. Olho para baixo; sinto vertigens; não sei se vou conseguir caminhar até ao fim. Mas porque sentirei eu isto? Agora que o digo já não o sinto. Tenho a lareira acesa, vamos à Beggar’s Opera. Só que isto paira em mim; não posso fechar os olhos a isto. É uma sensação de impotência: a sensação de não estar a realizar nada. Aqui estou eu, em Richmond, e, como uma lanterna no meio de um campo, a minha luz esfuma-se na escuridão. A melancolia diminui à medida que vou escrevendo. Então porque não escrevo eu mais vezes sobre isto? Bom, a vaidade proíbe-mo. Quero ser um êxito até aos meus próprios olhos. Contudo, este não é o fulcro da questão. É que não tenho filhos, vivo afastada dos amigos, não consigo escrever bem, gasto muito dinheiro em comida, envelheço – dou demasiada importância aos quês e porquês; dou demasiada importância a mim mesma. Não gosto que o tempo esmoreça. Se assim é, então trabalha. Pois é, mas o trabalho cansa-me logo – só posso ler um bocadinho, uma hora a escrever e já não posso mais. Ninguém vem para aqui entreter-se um bocado. Se isso acontece, zango-me. Ir a Londres é um esforço enorme. Os filhos da Nessa crescem e não posso tê-los cá para o lanche, nem levá-los ao Jardim Zoológico. O dinheiro para os meus alfinetes não dá para muito. Contudo, tenho a certeza de que estas coisas são triviais: é a própria vida, penso eu por vezes, que é assim tão trágica para esta nossa geração – não há um cabeçalho de jornal que não tenha um grito de agonia de alguém. Esta tarde foi o MeSwiney, e a violência na Irlanda; ou então é uma greve. Há infelicidade em todo o lado; está mesmo atrás da porta; ou há estupidez, o que é pior. Mesmo assim, não consigo arrancar este espinho. Sinto que voltar a escrever o Jacob’s Room me vai fazer recuperar a fibra. Acabei o Evelyn: mas não gosto do que escrevo agora. E apesar de tudo isto como sou feliz – se não fosse esta sensação de haver uma faixa de passeio sobre um abismo.


Virginia Woolf

Rasga-os da mente se souberes de cór

Posted on 20:34
"Que tempos difíceis eram aqueles: ter a vontade e a necessidade de viver, mas não a habilidade."
É assim que me sinto hoje. Hoje eu não podia adiar a escrita, o trabalho, o estudo, os códigos e as responsabilidades censuram a melancolia.
Isso parece bom, parece simples acumular trezentas e sete tarefas para esquecer. Apagam-se as leis, fecham-se as bocas e dos murmúrios não escuto mais, o coração também se afasta... e como é bom não ter coração.No esconderijo do sol começa a crescer o inimigo. É hora de descansar da exaustão da mente, do corpo, dos olhos. A mente, no entanto, cospe injúrias, esquece de esquecer. 
Nos relapsos de lembranças, no silêncio das calçadas, me vem tudo que me dói, tudo que corrói. A dificuldade de se relacionar com as pessoas e a facilidade para seduções baratas, a incapacidade de planejamento e organização, a impotência e o sentimento de intelecto inferior, as reviravoltas do amor/humor e a angustia... angustia mansa que chega devagar sem se notar, angustia braba que se dá com um baque e envergonha. 
No entanto, tudo que tenho feito é deixar a angustia de lado, tentar desconsiderá-la como um livro esquecido na estante. Ignorá-la e torná-la até mesmo risível depois de algum tempo... Mas minha grande inimiga se recusa a ser tratada simplesmente como uma pessoa que é preciso deixar por aí, nas estantes da vida. O seu grande problema é estar entranhada, funda e segura de sua permanência. Tentar combatê-la com meio internos, químicos, neurológicos é uma maneira de tentar vetar algumas das consequências de seus sintomas. Sei que domar os sintomas físicos de maneira externa só vai adiar ainda mais o que está claro toda noite em meus sonhos. São tantos símbolos travando guerras ilegíveis dentro de mim, procuro lê-las mas são tão difusas, paralelas... Ignoro-as, não escrevendo. Censuro-as através do corpo, das fobias, do pânico. 
E no mais, meu problema é sempre o medo. Tenho um medo aterrorizante e constante, das pessoas, da exposição, da rua, da cobrança do trabalho e do sentimento de impotência nos estudos. Tenho medo, acima de tudo, de não ter o apoio dele ao meu lado, ou pior, dos dias em que suas ações me repelem, censuram a angustia e fazem eu me trancafiar cada vez mais nesse meu mundinho do país das maravilhas, que das maravilhas só tem o nome e literatura.  



"Rasga,
Rasga-os da mente se souberes de cór."

Florbela Espanca




Desvendar o Azul

Posted on 19:54 In:






























Não há mais mentiras nem verdades aqui,
A medida que escrevo, o leão se doma.
Mistura sol, leite e lítio. Toma.

Permaneço convencida que é preciso persistir, continuar gritando,
Mesmo que se trate de uma voz pregando em desertos.
É preciso continuar escrevendo,
Por você, por mim, por Chico.
Ainda busco-o sabia? Minha Alemanha.
Busco toda a alegria das cirandas de sábado.

No entanto, os ombros doem, os olhos ardem...
Faço-os pararem, sufocam, invadem.
Tragam-me o azul, desvendem o azul!

Por que me priva do meu único pedido, déspota?
Das minhas artes, pouco vinho resta.
A fina gaze diáfana do vermelho desbotado.
Tiraram-me do palco; "não vês como é manchado, barateado?"
A balança pesa, a espada dói, me vendaram...
Deus, me vendaram do meu azul.



Nicky Morris era jovem - aos 31 anos, era até mais jovem do que dois ou três alunos da seção. Vestia-se como nós. Até falava em tom coloquial - dizia "coisa", "esse negócio", "sabem como é". E além da afinidade de maneiras, havia uma aliança mais sutil entre Morris e a turma. Desde o início ficou óbvio que Nicky era um forasteiro na HLS*, como nós éramos recém-chegados. Ele criticava abertamente a faculdade de direito e a instrução jurídica geral.
- Terão um poder enorme para fazer coisas terríveis quando concluírem o curso - disse ele - Ao começarem a exercer a advocacia, ficarão chocados com as incríveis oportunidades que encontrarão para arrasar com as vidas de outras pessoas. Isso não tem nada de engraçado, embora a maioria dos professores de direito, por algum motivo, não goste de falar sobre a capacidade destrutiva que todos vocês terão como advogados. Espero que possamos conversar a respeito aqui e espero também que falemos sobre algumas das coisas boas que serão capazes de fazer, as quais, infelizmente, são um pouco mais difíceis de realizar.

*Harvard Law School




















Um tumulo, aquele quarto; nossos sofrimentos e temores sepultados em ruínas.
Impossível a ressurreição.
Não me viriam pensamentos amargos, quando em minhas horas de insonia evocasse novamente aquele quarto no segundo andar.
Pensaria nas paredes e em como, entre elas, fui feliz.
Teria recordações do jardim, das rosas no estio do vizinho, dos pássaros e do coral a cantar pela manha.
Do chá sob a sombra do castanheiro emoldurando as paredes, do murmurio dos seus dedos encontrando-se com os meus pela noite.

O luar tem grande influencia sob a imaginação, mesmo a imaginação de quem começa a se desfazer de um sonho.
E ali, queda e silenciosa, eu jurara não ser a minha própria casa, recheada dos seus passos e cachos morenos, uma concha morta, mas um ser que respirara, palpitando vida como outrora.

Meu coracao palpita acelerado; um ardor nos olhos impede-me as lagrimas.
É preciso prometer que o tempo não quebrara a perfeita simetria do que fora,
Mas hei de abrir as mãos, e tirar do concavo minha joia mais preciosa
Para lançar-me ao infinito em busca de outras que virão

Allure

Posted on 18:18 In:




















E aquele Channel que ele me deu, permanece marcando a poeira no canto da estante
Que do desejo, nem seu caro aroma foi capaz de despertar
Do deslizar da escova nos fios, vermelhos, compridos... sera que assim, era como você os queria? Ou haveria eu de cessar a comparação aos outros tons?
Nada que em mim vive parece com seu ideal
Tudo que em mim jaz apodrece em tuas mãos
Meu corpo jovem, magro... ainda é o que você quer? de súbito, humildemente me vi a mais comum das mulheres
Da hera que cobre o jardim, surgem outras, diferentes. Talvez no começo não fossem melhores, talvez de fato, ainda não o sejam, mas o diferente se tornou uma opção melhor que o ordinário.
Vejo-o a todo instante nos olhos das amizades que o cercam, a origem das tumbas e dos históricos das noites em que você nao me quer.

A mente derrete meu moço, é o medo.
Que desse segredo, doentio de discórdia, não sabe mais fantasiar.
Ouso dizer que foi advindo do seu plantio, que o roseiral tornou-se deserto,
Encoberto, inseguro. Acanhado em outros lençóis.

Das minhas oito patas

Posted on 20:40 In:




























Em luas como essa, são eles, somente eles, que me mantém quando já não há nada.
Quando todos do lugar externo conseguem o pretendido, quando já não há mais o que sugar.
Desta marcha torta, carrego nos pés grandes olhos peludos, desvencilhando-me da última página virada...
Vai chegar, paciência, é tudo que vós digo. Sua jornada torta só acabou de começar.
Dentre objetos caídos, arranhados e sujos cresce o amor da menina, não mais tão desalmada.
Enfeitiçada, ouso dizer, pelas oito patas que sujaram o quarto florido.
Logo quando despertou Aurora, frágil com o vestido azul, bordado de madrugada.

Marina

Posted on 20:24 In:



















“Quando entro numa crise, o que mais me incomoda é a sensação de não existir. É como se não houvesse motivos pra eu viver. Um vazio, uma angústia. Nada ao meu redor parece ter cor. Tudo é cinza. Sinto as coisas em câmera lenta.
No entanto, meus pensamentos ficam exageradamente rápidos. Sinto uma grande ansiedade, uma incômoda agitação interna. Minha mente fica tão acelerada que, depois do fim da crise, sobra uma grande confusão mental. Algumas vezes, chego a esquecer das situações que passei. Em outras, não consigo identificar se aquilo aconteceu ou se foi um sonho. Mesmo a noção de tempo parece confusa. É como se estivesse em queda livre, num buraco escuro, frio, úmido, sem fim, com muitas imagens passando pelos meus olhos e vozes e sons, vários, zumbindo nos meus ouvidos sem parar. Procuro evitar aquela avalanche de informação, agarrar-me em alguma coisa. Mas não consigo encontrar nada para me amparar. Fico verbalmente agressiva, irritada com qualquer um ou qualquer coisa, impaciente. Sinto-me atacada, invadida a todo momento e, então, ataco de volta.
Existe uma variação muito grande de humor. Pelo menos comigo, em toda crise, o pensamento de suicídio é recorrente. E a sensação de falta de esperança também. As duas piores coisas ao sair de uma crise são a vergonha e o medo da recaída”.

e eu, passarinho.

Posted on 13:54 In: ,

























e tornar tudo tão difícil
sem optar
foi no último minuto
exaustão de quem se mantém no controle
sempre no controle, eu sou

adormecer com um olho fechado e o outro vidrado
e todas as lindas canções da estrada, onde estão?
não lembrei, não lembrar não é errado.
e o errado é direito

esqueceu,
não organizou,
atrasou,
mudou de ideia,
repetiu as letras,
trocou as vogais.

é culpa da doença,
é culpa da doença,
é culpa da doença.
se conforma, se injeta.
é culpa do vício,
é culpa do vício,
é culpa do vício.
restaram resquícios, não se projeta.

o erro, simples, mediano ou complexo.
de que importa?
por que tão errado, vergonhoso, perplexo?
"eu não quero" é mais fácil do que "eu não consigo" menina

e dos seus tropeços eu sempre sou.
e do seu ninho eu sempre sou.
e das suas desculpas eu sempre sou.
e do seu amor eu sempre sou.
e das suas certezas incertas eu sempre sou .
e eu, passarinho.



























A precariedade das perpectivas se abate sobre as olheiras profundas, a pela fina, roxa e abatida.
É como diziam: mente vazia oficina do diabo. Do diabo não sei ao certo qual intertextualidade escolher, mas sei que a cama cresce, a mente padece, o corpo perde peso e os cabelos caem.
Estou cansada de estar cansada. Estou exausta de não me mover, o vento continua soprando no meu rosto, a vida continua a ir e o que mais é essa falta além de perder tempo esperando as rugas aparecerem?
Não consigo chorar por mais de alguns minutos, sou incapaz de manter até mesmo o estado de felicidade quando o alcanço.
Abandonei o corpo depois que a mente resolveu se enterrar de novo na areia escura. Foi-se pele, carne, brilho e textura.
Não quero roupas, tudo que escolho me cai mal. Não quero espelhos, não gosto do que vejo. Não quero pessoas, me sinto patética perto delas. Não quero você, não quero nossa vida inútil e comum. Não quero te afundar comigo, hoje você deixou claro sem nenhuma palavra que está farto de me salvar.
Fico sozinha mais uma noite com a cama grande e os calmantes. Na mente falta o Lithium, no corpo antibiótico, no estomago a comida e na boca o seu gosto.
Nada é mais patético do que a auto piedade, saber disso machuca mais. Nada mais ignorante do que desistir de si mesmo, do que cogitar por horas a fio se realmente vale a pena... Desistir aos poucos é mais fácil. A covardia se escancara mesmo na mais drástica decisão.
O que ronda no teto do quarto não é mais o fato de que não faria diferença, é a certeza de que sim, faria diferença, aliviaria o peso, o fardo o físico dos que não suportam mais ser estepes.
Penso que juntando tudo que causo a eles, o peso poderia ser maior do que o que sinto agora me inclinando sobre a cartela de valium.
O insustentável peso de Ser é a explicação da paixão dos suicidas.